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Por que o RS é o estado com mais adeptos de religiões de matriz africana?

Em números absolutos, foram 306.493 pessoas com 10 anos ou mais que declararam fazer parte de alguma das duas religiões Imagem: Nikada/iStockphoto

Do UOL, em São Paulo*

12/06/2025 05h30Atualizada em 12/06/2025 17h08

O Rio Grande do Sul é o estado brasileiro com mais adeptos de religiões de matriz africana, segundo os dados do Censo 2022, divulgados na semana ada. O posicionamento de entidades locais contra o racismo e o ado escravocrata ajudam a entender esses números, segundo especialistas ouvidos pelo UOL.

O que aconteceu

Estado sulista tem 3,2% da população com 10 anos ou mais seguindo a umbanda, ou o candomblé. Essa primeira pesquisa divulgada pelo IBGE não contempla outras crenças de origem africana. No Censo 2010, o Rio Grande do Sul também liderava entre os estados com mais adeptos de religiões de matriz africana.

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Trabalho de escravizados no século 19 pode ter relação com número de adeptos, diz pesquisador. "A economia no estado naquela época era amplamente baseada no trabalho escravo, especialmente nas charqueadas - locais para produção de carnes salgadas - do extremo sul e de Porto Alegre", explica Vitor Queiroz, coordenador do NER (Núcleo de Estudos da Religião), da UFRGS.

Religião afro-gaúcha indica forte presença das crenças de origem africana no Rio Grande do Sul. "A chamada Nação ou Batuque, a mais antiga religião afro-gaúcha, é documentada há mais de 150 anos no estado. Se somariam depois a umbanda e a quimbanda, vindas do Sudeste já no século 20. A quimbanda, inclusive, tem uma expressão aqui na região maior do que em qualquer outro lugar", afirma Queiroz.

Em números absolutos, foram 306.493 pessoas com 10 anos ou mais que declararam fazer parte de alguma das duas religiões. Dessas, 55,3% eram brancos, 24,5%, pretos, e 19,5%, pardos.

Umbandistas e candomblecistas brancos rebatem o estereótipo do seguidor de crenças africanas, analisa especialista. "Um branco gaúcho macumbeiro sintetiza a derrota ideológica da falácia de que a macumba seria uma religião de preto analfabeto, desocupado e fetichista. A diferença é que o branco, por ser branco, arca com metade do ônus de assumir publicamente sua pertença religiosa e a fazer o enfrentamento público da intolerância religiosa", diz o advogado Hédio Silva Jr, coordenador do Idafro (Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-brasileiras).

A Bahia é a 'Roma Negra', mas, sem dúvida, o Rio Grande do Sul é o 'Vaticano da Macumba'. Sempre foi Advogado Hédio Silva Jr.

Luta contra o racismo

Vitor Queiroz também cita a atuação de entidades locais contra o racismo para explicar os números. O pesquisador cita a Afrobras (Federação das Religiões Afro-Brasileiras) e a Asidrab (Associação Independente em Defesa das Religiões Afro-Brasileiras). "O alto índice de adeptos representa o orgulho crescente dos fiéis dessas religiões, promovido diretamente por essas entidades", afirma o professor.

Clube para negros em Porto Alegre foi fundado ainda durante a escravidão. O produtor cultural Luiz Augusto Lacerda, 42, é um dos diretores da Sociedade Beneficente e Cultural Floresta Aurora. O clube é destinado a pessoas negras e foi fundado em 1872, ainda durante a escravidão no Brasil.

Espaço segue acolhendo negros, como fazia com escravizados há mais de um século. "Continua sendo um refúgio para o negro em Porto Alegre. Promovemos eventos, almoços, campanhas beneficentes, além de ações culturais, como o letramento racial", conta Lacerda.

No ano ado, as religiões de matriz africana foram acusadas de causar as enchentes no Rio Grande do Sul. Em março deste ano, a influenciadora Michele Dias Abre, uma mulher branca, foi condenada pela Justiça de São Paulo a pagar uma indenização de R$ 35 mil por associar as enchentes às crenças africanas.

Evidentemente, as pessoas brancas não sofrem individualmente o mesmo tipo de preconceito que os negros, mas, por outro lado, há um curioso processo de manutenção do racismo religioso independentemente da cor de pele dos fiéis. Isso porque que as religiões de matriz africana são constantemente associadas à preconceitos primitivistas. Associadas, por exemplo, ao mal, a superstições, a selvageria Pesquisador Vitor Queiroz

*com informações de reportagem publicada em 05/06/2024

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